Alegando questões de segurança, a Polícia Civil de São Paulo guarda num cofre 409 identidades de artistas, celebridades, políticos e personalidades históricas que passaram pelo estado desde 1900 até os dias atuais. Os documentos, que recebem o carimbo “reservado”, estão arquivados numa espécie de armário à prova de fogo sob os cuidados do Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt (IIRGD), na capital paulista.
Levantamento feito pelo IIRGD mostra que estão catalogados no cofre 67 personalidades históricas, 128 celebridades e 214 políticos.
Esse reforço na proteção tem como principais objetivos evitar vazamentos de dados sigilosos e preservar a memória histórica dos famosos. Na sala climatizada, o cofre é vigiado por câmeras de monitoramento e só pode ser aberto por dois funcionários. Além deles, ninguém tem as chaves e o código de acesso ao equipamento.
Em seu acervo estão informações, vias de registros gerais (RGs), fotos, recortes de jornais e até algumas fichas criminais de pessoas famosas. Entre os rostos conhecidos, estão os dos ídolos do esporte brasileiro, Pelé e Ayrton Senna; de celebridades, como a modelo Gisele Bündchen; e inventores, como Santos Dumont.
“O instituto guarda todos os fichários desses famosos no armário-cofre, vigiado por câmeras, por questões de segurança”, disse o delegado José Brandini Jr., do IIRGD. “É para evitar o risco de que haja vazamento de informações sigilosas dessas figuras públicas, como endereços, telefones, venda de dados para revistas de celebridades, falsificações, riscos de sequestros etc.”
O critério para que uma pessoa tenha seus documentos levados para o cofre dos famosos é simples. “Basta ser famoso”, explicou Brandini Jr. “Todas as fichas, de famosos e não famosos passam por uma triagem manual. Quando surge o nome de alguém que está na mídia, um artista e cantor, por exemplo, essa ficha é separada das demais”.
De acordo com Brandini Jr. , por conta dessas medidas de proteção tomadas, o instituto nunca registrou vazamentos de informações sigilosas de famosos. “Temos muitos funcionários responsáveis por arquivamentos de fichários, então quando temos conhecimento de que algum famoso vem tirar o RG aqui, por exemplo, tomamos o cuidado de carimbar sua pasta com o ‘reservado’ e guardá-la no cofre.”
O G1 teve autorização para visitar o “armário dos famosos” que está sob os cuidados do instituto. Durante o trabalho, a equipe de reportagem foi acompanhada constantemente por policiais. Foram permitidas imagens das fotografias, mas sem mostrar dados pessoais dos documentos, como endereços e telefones, por exemplo.
Pelé, Senna, Gisele e Dumont
Na ficha do rei do futebol, por exemplo, é possível ver fotos de um Edson Arantes do Nascimento mais jovem, de terno e gravata. E fotografias dele mais velho, já como Pelé, estampando um sorriso aberto.
O tricampeão mundial de Fórmula 1 morto em 1994 tem na sua pasta uma foto adolescente, com 16 anos. No documento, ainda assinava “ASSilva” de Ayrton Senna da Silva. Anos mais tarde, quando começou a competir no exterior, passou a escrever o sobrenome Senna.
Para não causar alvoroço, a top model brasileira mais conhecida no mundo pagou R$ 129 para receber um funcionário do IIRGD no hotel onde estava na capital paulista. O serviço pode ser requisitado por qualquer cidadão comum que queria ou esteja impedido de ir a uma unidade para dar entrada no RG. Para isso, terá de pagar a taxa que Gisele Bündchen pagou, segundo informou o instituto.
Apesar de morar nos Estados Unidos, Gisele decidiu fazer um RG em São Paulo em 2013. Ao lado de sua foto 3×4, consta que ela tem o segundo grau completo e 1,78 m de altura. E apesar de ser casada com o jogador de futebol americano Tom Brady, com quem tem dois filhos, na sua ficha de identificação ela aparece como solteira. Ela se casou nos EUA em 2009.
O criador do 14 Bis, entre outras aeronaves, tem na sua pasta uma cópia do RG original do início do século 19, quando o documento mostrava duas fotografias da pessoa: de perfil e frontal. Também há detalhes físicos de Santos Dumont, como tipo de cútis, cabelos, barba, bigode, sobrancelha e íris.
Esporte
O ex-jogador de futebol Ronaldo Fenômeno mostrou que, apesar de carioca, usou a camisa do Corinthians na foto da sua identidade. Da seleção brasileira que ficou em quarto lugar na Copa de 2014, estão os fichários dos RGs de Oscar e Hernanes. O atual coordenador técnico do Brasil, Gilmar, aparece com o sobrenome grafado como Rinaldo e não Rinaldi, como é conhecido.
O esforçado piloto Rubens Barrichello e o bicampeão mundial de F-1 Emerson Fittipaldi também estão com suas fichas no setor “reservado”. Rubinho, como ficou conhecido, aparece com fotos mais recentes e antigas, ainda adolescente. O Rato, apelido de Fittipaldi, tem retratos que o mostram desde jovem, com costeletas, até os dias atuais.
Campeã mundial e vice-campeã olímpica de basquete, Hortência surge nos arquivos do IIRGD em fotos com cortes de cabelos que eram moda na adolescência, juventude e fase adulta.
Artistas
Também há RGs de cantores, como Fábio Júnior, na versão com rugas e na antiga, cabeludo. Sérgio Reis e o baiano Caetano Veloso, que entre outras músicas escreveu “Sampa”, também chegaram a fazer suas identidades por São Paulo.
No caso do pagodeiro Belo, estão arquivadas as fichas civil e criminal – ele já teve passagens pela polícia por suspeita de envolvimento com o tráfico de drogas.
Entre as cantoras, a roqueira Rita Lee também tem sua ficha criminal – de uma passagem policial por porte de entorpecente nos anos de 1970 – guardada no setor “reservado”. Identidades de outras divas da música, como Angela Maria e Elis Regina, integram o acervo.
Dados dos apresentadores Silvio Santos (que aos 18 anos foi paraquedista do Exército), Hebe Camargo, Gugu Liberato, Adriane Galisteu e Ana Maria Braga são protegidos no cofre como o de outros artistas. Entre os atores estão documentos de Eva Wilma, Francisco Cuoco, Bruna Lombardi, Raul Cortez, Juca de Oliveira e Caio Blat.
O padre Marcelo Rossi não abandonou a batina nem na foto. Ela está dentro de seu fichário para tirar o RG.
Autoridades
Além dos famosos, políticos, juízes, promotores e policiais têm suas fichas cadastrais arquivadas em separado da base de outras pessoas civis no IIRGD. Esses fichários ficam em outros locais, não necessariamente num cofre. “No caso de policiais, governadores, juízes e promotores existe restrição na pesquisa inclusive no banco de dados digital. Tem senhas específicas para manuseio”, disse Brandini Jr. “São Paulo está sendo pioneiro em critérios de segurança na carteira de identidade.”
Ao todo, são 58 milhões de RGs civis arquivados sob os cuidados do instituto. Eles, no entanto, não têm tanta restrição de manuseio se comparados com os RGs de famosos.
Fonte: G1
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