Parte das famílias está vivendo com aluguel social, enquanto outra está em abrigos; cidades aguardam verbas
“Quando acendi a luz, vi a parede rachada. Mandei minha esposa e meus filhos para a casa da mãe dela. Fiquei, mas não consegui nem dormir, com medo. Isso era sexta e a casa caiu no sábado. Eu já tinha saído também e me ligaram pra dizer. Cheguei e vi essa cena”, diz William José Lopes, em frente ao que um dia foi a morada da família.
Ele é um dos moradores do município de Pilar, uma das cidades alagoanas fortemente atingidas pelas chuvas que castigaram o Estado nas últimas semanas, a perder tudo. Mas não o único: só no local, cem residências ficaram totalmente destruídas. Outras 800 foram danificadas.
Muita gente perdeu tudo. Não sobrou nada do pouco que tinha. Na terra natal de William, assim como em Marechal Deodoro, Maceió e Jacuípe, as mais prejudicadas, os desabrigados foram levados, entre outros lugares, para escolas públicas. Em Pilar, três delas ficaram sem condições para aulas devido à água ou a problemas estruturais causados por ela.
Quem não foi para lá precisou procurar um cantinho para alugar – boa parte das famílias atingidas em Alagoas vem recebendo aluguel social pago pelas administrações municipais. É o caso de Thamires Carvalho, desempregada e com dois filhos, de 2 e 7 anos. O marido também está à procura de um trabalho.
Vizinha de William, ela estava em casa quando a tragédia começou a se anunciar. Ainda conseguiu tirar uns poucos pertences de casa. “Umas 5h da manhã a parede começou a rachar. Saímos desesperados e consegui tirar algumas coisas, mas com muito medo. Agora estou em uma casa alugada. A prefeitura deu alguns alimentos e estamos vendo como vai ficar”.
Para piorar a situação, a energia da cidade precisou ser desligada. Era necessário evitar novos acidentes. Aos poucos, ela foi sendo restabelecida, mas ainda não na rua onde moravam os dois. Os postes precisarão ser trocados e serão realocados do outro lado da via, mas é necessário esperar que a terra esteja mais seca.
Shirlane Nascimento também vive lá, na parte que não foi prejudicada com as chuvas – o que não significa que ela não tenha passado por transtornos. “Estamos sem energia desde 9h da manhã de sábado. As coisas da geladeira ficaram todas podres. Está muito difícil e estamos sem previsão de quando isso vai voltar”, aponta ela.
As incertezas se multiplicam. Ainda em Pilar, Valdenira Pereira pensa no que fazer. A residência dela não foi afetada, mas está debaixo de um barranco que ameaça desabar. O medo é uma constante. “Vim morar aqui há muito tempo e essa não é a primeira vez que acontece. As casas já caíram antes e tivemos que reconstruir tudo. Não vou ter como ficar porque está muito perigoso. Vou sair, mas não sei para onde”.
Pista foi fechada após barreira ceder e ameaçar desabar em casas
FOTO: LARISSA BASTOS
De acordo com o Corpo de Bombeiros e a Coordenação da Defesa Civil Estadual, o município foi o segundo mais prejudicado no interior do Estado. Ao todo, 24 áreas afetadas pelo temporal, deixando 300 pessoas desabrigadas e quatro mil desalojadas – 25 ainda acabaram feridas.
Em Marechal a situação é ainda pior: 14.970 atingidos. Mais de seis mil famílias estão desabrigadas, parte delas alocada em espaços designados pela prefeitura. Outros foram para a casa de parentes, mas ainda com precariedade. Até quem conseguiu uma moradia no conjunto entregue emergencialmente no fim de semana passa dificuldades.
Nos abrigos, o aperto é grande. “Aqui no quarto onde a gente está a maioria das pessoas perdeu o fogão, porque entrou água. Só um fogão está funcionando. A gente está dividindo pra 25 pessoas. São oito famílias nesse cômodo”, diz Yasmin Araújo, morando por lá já há uma semana.
Com tanta gente dividindo espaços tão pequenos, fica difícil manter a estrutura funcionando. “Estamos sem privacidade. Os banheiros estão alagados, então entra mulher, homem. A situação é horrível e quando lava roupa enche tudo. Fica pior do que onde a gente estava”, conta Maria do Carmo.
Os dois, assim como outros 25, estão na lista dos municípios que decretaram situação de emergência. Já preencheram o Financiamento Especial para o Desenvolvimento (Fide) e esperam a liberação de recursos do governo federal. Os valores ainda não foram definidos e, enquanto isso, eles contam com a ajuda de um hospital de campanha do Exército, estrutura montada no Polo Industrial.
O prefeito de Pilar, Renato Filho (PSDB), diz não saber o que fazer enquanto aguarda a verba. “As pessoas estão sem geladeira, cama, armário e eu, sinceramente, estou sem saber como lidar com essa situação. Se eu fizer para um, vou ter que fazer para todos”, ressalta.
A população parece tão perdida quanto ele. “Ainda não sei o que fazer. Já tinham nos avisado antes desse risco de desabar, porque quando chove fica perigoso, mas nunca tinha acontecido nada desse jeito. Tem 39 anos que moro aqui e agora estou de aluguel, ainda esperando o que pode ser feito”, acrescenta William, enquanto remexe nos escombros da casa.
Gazetaweb
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