Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que o índice de novos infectados por HIVAids no Brasil subiu 11% entre 2005 e 2013, em contramão aos dados do mundo que vêm diminuindo. Em Alagoas o número de infectados é bem pior, segundo Mardjane Lemos, médica infectologista, coordenadora de Serviços para os portadores de HIV do Hospital Helvio Auto (Hospital de Doenças Tropicais).
Segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado (Sesau), em Alagoas, a epidemia da Aids vem com tendência crescente, com registro de 4.349 casos notificados (Dados do Sinan – Sistema de Informação de Agravos de Notificação – 1986 a dezembro 2012). O sexo masculino é onde houve maior notificação, com 2.864 casos, contra 1.485 do sexo feminino.
Atualmente a epidemia de Aids em Alagoas cresce em todas as faixas etárias com maior predomínio na faixa etária de 30 a 39 anos, segundo os mesmos dados da Sesau. “A taxa de detecção de Aids no ano de 2012, foi de 11.9 casos por 100 mil habitantes, superior as taxas dos anos anteriores”, diz o mapa da secretaria.
Alagoas ocupa a 6ª posição entre os estados do Nordeste com maior risco de adoecer por Aids, ficando abaixo dos estados de Pernambuco, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba. Quanto ao número de óbitos registrados no Estado, os homens continuam morrendo mais em consequência da Aids: foram 1.365, sendo 971 do sexo masculino e 382 do sexo feminino.
Os dez municípios alagoanos com maior número de casos são: Maceió – 2.909; seguido de Arapiraca – 190; Rio Largo – 88; São Miguel dos Campos – 71; Palmeira dos Índios – 60; União dos Palmares – 58; Marechal Deodoro – 55; Pilar – 40; Murici – 39; Penedo – 34.
Segundo os mesmos dados da Sesau, todas as faixas etárias apresentam crescimento, mas a de maior concentração é de 30 a 39 anos, seguida da faixa de 40 a 49 anos. A categoria de maior exposição para os casos de Aids são os heterossexuais superando a categoria de homossexuais.
Hospital Helvio Auto atende 1.500 pacientes com HIV
Há cinco anos trabalhando com pacientes com HIV, a infectologista Mardjane Lemos observa que Alagoas é sempre pior do que o restante do País no que se refere aos casos de Aids. “O número de infectados em Alagoas continua crescendo; não é diferente do País; pelo contrário, teve um aumento de 30%”, entre o mesmo período da pesquisa.
No Hospital Hélvio Auto cerca de 1.500 pacientes com HIVAids são tratados e segundo a médica anualmente são notificados mais ou menos 300 casos de paciente infectados. “Os dados são sempre subestimados, porque no Brasil a notificação de uma pessoa soropositiva não é obrigatória”, segundo ela.
A infectologista ressalta que têm algumas doenças que se o médico descobre que o paciente é portador tem a obrigação de informar ao Ministério da Saúde. “No caso do HIV a notificação só é obrigatória quando o paciente já está doente”, destaca.
RECOMENDAÇÃO
A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que sejam notificados todos os casos e a partir desse ano ou do próximo, segundo Mardjane Lemos, vai mudar a questão da notificação no País. Segundo a médica, a maior forma de transmissão da Aids atualmente no Estado é pelos heterossexuais.
“Hoje em dia não se fala mais em grupos de risco, mas em comportamento de risco. Aqui em Alagoas a principal forma de transmissão é a sexual e nos heterossexuais é onde se dá a maior forma de transmissão”, observa.
Mardjane Lemos destaca ainda que aumentou o diagnóstico e também a oferta de teste, motivo pelo qual aumentou o número de infectados no Estado. Mais pessoas estão tendo a oportunidade de descobrir o problema com o aumento do diagnóstico, mas segundo a coordenadora, o motivo principal não é só esse.
“É realmente a banalização do cuidado com a relação sexual, embora os preservativos sejam distribuídos amplamente. Ninguém pode dizer que tem dificuldade de acessar os preservativos porque tem nos postos, as pessoas não usam, é uma questão cultural mesmo”, argumenta.
Em Alagoas homens são mais infectados que as mulheres
Os homens são a categoria mais infectada no Estado. A médica avalia que muitos têm dificuldade em aderir ao preservativo: “Não é à toa que eles são a maioria com o problema. Está aumentando a proporção de mulher para homem, mas a maioria é homem”, destaca.
A especialista informa também que a medicação para os portadores do vírus HIVAids é distribuída gratuitamente, no próprio Hospital Hélvio Auto, no Salgadinho e no Hospital Universitário. “A medicação é gratuita; não se vende medicamento antirretroviral no país, mesmo as pessoas que têm plano de saúde, venham de consultório particular, a medicação é do serviço público”, relata.
Segundo a infectologista, embora o Ministério da Saúde recomende fazer exame independente da situação do paciente, o médico faz uma série de avaliações para poder iniciar o tratamento.
“Tem paciente que chega muito bem e a gente tem tempo na primeira abordagem de fazer um exame, acompanhamento, trabalhar a adesão; outros já chegam realmente doentes, com alguma infecção grave e com sinais de que a doença está realmente avançada. Nesses casos a gente tem que iniciar a medicação o mais rápido possível”, explica.
Indagada sobre como é possível detectar em um primeiro momento se a pessoa está infectada com HIV, a médica destaca que existe a sorologia, que é um exame cujo resultado demora um pouco para chegar. O outro exame é o teste rápido, que é parecido com o da glicemia, com um aparelho que fura o dedo e com meia hora já tem o resultado, depois é feito um segundo teste para confirmar se o paciente é soropositivo.
Os óbitos em pessoas em decorrência da infecção pelo HIVAids ocorrem atualmente, segundo Mardjane Lemos, principalmente naqueles pacientes que descobrem a doença muito tarde, acabam tendo uma infecção grave e já chegam bem debilitados, numa situação muito difícil.
“O segundo grupo que morre é aquele que iniciou o tratamento e não se cuidou. Perdi um paciente esta semana por esse motivo. Ele não se cuidou, acabou contraindo tuberculose e morreu”, relata.
Segundo a médica, o paciente com HIV que descobre o problema numa fase mais cedo e se cuida tem uma vida praticamente normal; vive por muito tempo. “Quem morre é quem não se cuida ou realmente quem não teve a oportunidade de descobrir a tempo”, descreve.
DADOS DO BRASIL
Segundo o relatório da Organizações das Nações Unidas (ONU), o Brasil tinha 730 mil pessoas com Aids vivendo no país em 2013, número que representa 2% do total mundial. “Estima-se que 44 mil pessoas tenham contraído o HIV apenas no ano passado, montante que também representa 2% do total global”, diz o estudo.
Os dados das Nações Unidas afirmam que 16 mil pessoas com HIV morreram no ano passado e que 327.562 pessoas utilizavam antirretrovirais. Em relação à América Latina, 47% dos novos casos registrados no ano passado surgiram no Brasil, sendo o México o segundo país com mais contaminações novas.
De acordo com a ONU, os grupos particularmente vulneráveis a novas infecções são transexuais, homens que fazem sexo com outros homens, profissionais do sexo e seus clientes, além de usuários de drogas injetáveis.
No fim do ano passado, o Ministério da Saúde havia divulgado que o país tinha cerca de 700 mil pessoas infectadas pelo vírus, sendo que 39 mil descobriram estar contaminadas em 2013. Além disso, o governo informou que 300 mil pessoas estavam em tratamento em 2013.
Paciente alagoano diz que não sabe como contraiu a doença
A reportagem da Tribuna Independente conseguiu permissão para entrevistar um paciente infectado com o vírus HIV que vamos chamá-lo de José, tem 47 anos, está internado em um hospital do Estado e embora fale muito pouco, contou que está hospitalizado há 40 dias e que está se sentindo bem, mas a família ainda não sabe que tem o problema.
Acanhado para falar na frente do irmão, seu José disse a princípio que sentiu uma dor nos rins, veio para o hospital e ficou internado. Mas o irmão dele informou assim que a reportagem chegou que ele já vinha doente há algum tempo.
Depois que o irmão saiu da enfermaria, seu José pediu segredo e contou que quando fez o exame, o médico disse que “acusou um negócio, o vírus, mas eu não sei dizer como foi que peguei; fui para o médico e ele passou um remédio e eu estou bem”, disse ele.
O paciente soropositivo disse também que não se cuidava nas relações sexuais que tinha: “Eu era muito perdido; tive muita relação fora do casamento e não me cuidei; vivia frequentando prostíbulos, desde muito cedo. Estou há seis anos com essa nova mulher e estou doente desde então, mas não sei informar como peguei; ela também não sabe que estou com o vírus”, explica.
PROGRAMA DST/AIDS
Segundo a Secretaria de Saúde, o Programa de DST/Aids tornou-se referência no Estado para o desenvolvimento das Políticas Públicas de Prevenção e Controle da Aids e outras Doenças Sexualmente Transmissíveis. “Sua missão é reduzir a incidência dessas doenças na população alagoana e promover a qualidade de vida das Pessoas Vivendo com HIV/Aids. Para isso, atua por meio de quatro grandes áreas: promoção, prevenção e proteção; diagnóstico, tratamento e assistência; gestão e desenvolvimento humano e institucional; parceria com OSC/ONG.
Tribuna Hoje
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